Música internacional para um dia internacional, 14 minutos pouca mistura e sem palavras:
- Zuf de Zur – Lidi ma Caje (Itália) – cantos da Resistência Italiana arraçados de esloveno.
- Beirut – Bratslava (EUA) – o puto fui à mesma Eslovénia, passou-se, e fez muito bem.
- Aysamgul – Serilma (Uygur) – a melhor música do mundo é deste povo. Se a China os deixar, o que não vai ser fácil.
- Les Musicians do Nile – Bitnadini Tani Lih (Egipto) – sim, os músicos do Nilo também podem ser ciganos.
(foto: 1 de Maio de 1974, Portugal, claro)
14:34m – 14 MB
Download – Dia Internacional
pérolas a porcos, nódoas a quem não tem dentes, pobres e mal agradecidos, foda-se:
esta merda acontece porque anda o autor do Rock Progressivo Português , e outros, que há mais, a dar as pérolas, as nozes, aos porcos, aos desdentados, aos pobres surdos de nós que não as descarregamos.
Em geral estamos a falar de quem tem a pachorra de recuperar os seus LP’s para MP3’s, preciosidades que as editoras não irão reeditar.
Vão lá ver e depois praguejam pelo que já não está disponível, e digam obrigado pelo que ainda está. O som nem sempre é famoso, mas são músicas que sem a fritadeirazinha do vinil também não tinham piada.
- Filarmónica Fraude – Epopeia (profecia)
- Filho da Puta Ainda Não Identificado – Hino da Mocidade Portuguesa
- Zeca Afonso – Grândola Vila Morena
- Coro Infantil de S. Amaro de Oeiras e outros Filhos da Madrugada – Grândola Vila Morena
- Charlie Haden – The Ballad Of The Fallen
- Mão Morta – A Revolução É o Remédio
João Cardoso (Photo: Moita da Serra, mural, 2007)
A Marcha Global da Marijuana é uma iniciativa internacional, pacífica, que tem lugar em várias cidades do planeta em simultâneo, sempre no primeiro sábado do mês de Maio.
O objectivo desta marcha é chamar a atenção dos governos, decisores políticos e instituições relacionadas com as drogas e a toxicodependência, e da sociedade civil em geral, para a problemática e o falhanço da proibição no reduzir do consumo, do tráfico de drogas e do crime associado, alertando para a necessidade urgente de uma legalização/normalização da Canábis, planeada e baseada na realidade e em factos científicos.
A cannabis sativa — popularmente conhecida por marijuana ou, na sua variedade concentrada, por haxixe — é a “droga leve” mais massificada mundialmente, estimando-se que 4% da população mundial a consuma, num total de 160 milhões de pessoas. Na Europa este número ronda os 24 milhões.
No entanto, a grande maioria destas pessoas consome cannabis numa situação completamente ilegal, cometendo um crime que pode incorrer em pena de prisão, tanto no hemisfério Sul, onde o consumo está enraizado na cultura de alguns povos, como no hemisfério Norte, onde a globalização das culturas difundiu o seu uso recreativo e medicinal, sobretudo para aliviar dores e indisposição causadas por doenças crónicas e terminais como o HIV ou o cancro.
A proibição põe em risco a saúde pública, fomentando o mercado negro e a adulteração dos produtos. Os maiores riscos para o consumidor e para a sociedade não existiriam se não existisse a proibição. O consumo não gera violência e criminalidade nem ameaça a saúde pública, a proibição sim.
Não sendo inócua, a Canábis é certamente uma das drogas conhecidas mais seguras. Os riscos do seu consumo são mínimos, principalmente quando comparada com outras substâncias largamente consumidas e aceites pela lei e pela sociedade
Ao associar-se apenas negativamente o cânhamo/cannabis a um narcótico, despreza-se o seu aproveitamento industrial (que em Portugal tem raízes seculares enquanto matéria prima têxtil), florestal e energético.
5 de Maio de 2007:
Marcha Global pela Marijuana:
No Porto, Em Lisboa
E em mais 199 cidades do mundo, cada vez mais perto de si.
(texto colado e adaptado dos manifestos do Porto e de Lisboa)
Sons e Música:
- Pink Floyd – Alan’s Psychedelic Breakfest
- Rolling Stones – Sing This All Together
- Os Mutantes – Panis et Circenses
- The Doors – Absolutely Live
- Os Mutantes – A minha Menina
- O’queStrada – Se Esta Rua
João Cardoso
21:15m – 20 MB
Download – Marcha Global pela Marijuana
- Tom Waits – The Piano Has Been Drinking (Not Me)
- the Rolling Stones – Love in Vain
- Cowboy Junkies – Sweet Jane
- Secos & Molhados – Não não digas nada
- Ao Bordel – Mon Homme
- Lula Pena – Teresinha
- e Brel a fazer de cortina
João Cardoso
18:17m – 17 MB
Guião Musical: perdido
Rádio mix: João Cardoso
Pintura: Isabel Rosas
11:35 m – 11 MB
Download – Até Sábado
- György Ligeti (Hungria) Le Grand Macabre, abertura do segundo acto.
- Camper Van Beethoven (USA) – O Death
- Kevin Blechdom (USA) – Shut the Fuck Up and Fuck Me
- Joe Jones (USA) – Xylophone edit
- Arrigo Barnabé (Brasil) – À Procura de Um Orgasmo Total
- Hazdam(Portugal) – Thinking in the Rain
- Kazuko Hohki (Japão) – Singing in the Rain
- Latigo Oteng (Uganda) – Rain Song
- Ahmed Hussain (Índia) – Kajri Dhun
- Tuxedomoon (USA) – You
- Chuva, trovoada (Apátridas) – Chuva, trovoada
O Dia Internacional da Mulher foi estabelecido a partir da data de uma greve de operárias nova iorquinas, em 8 de Março de 1857. Ou talvez não. Rezam algumas crónicas que patrões e polícias trancaram as mulheres dentro da fábrica, lançaram-lhe fogo, e 129 morreram carbonizadas.
Embora factos como este tenham sucedido mais de uma vez num século XIX liberal, quando os patrões faziam mesmo o que queriam, existe um misto de lenda e história na escolha da data.
Prefiro outra lenda, a do Pão e das Rosas, por vezes misturada com as do 8 de Março, que tem origem num poema com o mesmo nome da autoria de James Oppenheim, publicado em Dezembro de 1911, e oferecido às “mulheres do Oeste”. Está geralmente associado a uma greve do sector têxtil em Lawrence, Massachusetts, em Janeiro-Março de 1912, e que ficou conhecida pela Greve das Rosas e do Pão. A greve de Lawrence, que uniu dezenas de comunidades imigrantes foi, em grande parte, conduzida por mulheres. Muitos afirmam que, durante a greve, algumas das mulheres transportavam um cartaz que dizia Queremos pão mas também queremos rosas! Não existem provas fiáveis que o confirmem, e esta afirmação foi rejeitada por alguns veteranos da greve de Lawrence, provavelmente homens, está-se mesmo a ver.
E gosto particularmente deste provável mito por via do poema, fabulosamente cantado por Judy Collins, num album de 1976 com o mesmo nome. Existem outras versões, claramente inferiores.
Misturei 20 minutos com algumas das vozes femininas que mais gosto, porque além de pão e de rosas, hoje é uma bom dia para lhes dar, a elas, música e versos.
É mesmo o único dia do ano em que podemos oferecer seja o que for a todas as mulheres e nenhuma fica ciumenta.
Pão e Rosas
Enquanto marchamos, marchamos, na beleza do dia,
Um milhão de cozinhas negras, um milhar de moinhos cinzentos,
São tocados por toda a luz revelada por um sol repentino
Porque as pessoas nos ouvem cantar: Pão e Rosas! Pão e Rosas!
Enquanto marchamos, marchamos, lutamos também pelos homens,
Porque eles são as mulheres e são as crianças e são os nossos filhos outra vez
As nossas vidas não devem ser suadas desde o nascimento até ao fim
Os corações morrem de fome como os corpos; dai-nos pão, mas dai-nos rosas
Enquanto marchamos, marchamos, inúmeras mulheres morrem
Gritam através das nossas canções, o seu antigo chamamento pelo pão
É a pequena arte e amor e beleza que os seus espíritos macerados conhecem
Sim, é pelo pão que lutamos, mas lutamos igualmente pelas rosas
Enquanto marchamos, marchamos, trazemos os grandes dias,
O erguer das mulheres significa o erguer da raça.
Não mais o moinho e o tensor, os dez que labutam por um que repousa
Mas uma partilha das glórias da vida: pão e rosas, pão e rosas.
As nossas vidas não devem ser suadas desde o nascimento até ao fim
Os corações morrem de fome como os corpos; dai-nos pão, mas dai-nos rosas
James Oppenheim, versão da Elisa, que deve estar a fazer hoje 500 dias…
Vozes:
- Janis Joplin
- Judy Collins
- Elis Regina
- Patti Smith
- Alison Statton (young marble giants)
- Françoise Hardy
- Siouxsie Sioux (siouxsie & the banshees)
- Fiona Apple
- Värttinä
- Mari Boine Persen
- Mariza
- Uma anónima camponesa portuguesa
- Margo Timmins (cowboy junkies)
- Nico
20:06 m – 19MB
Download – Pão e Rosas
João Cardoso
Alexandre O’Neill que já tinha deixado poemas, dos pequenos grandes maiores do séc. XX,
inspira agora uma biografia, onde em livro Maria Antónia Oliveira faz um romance retrato, do poeta, vidas e desvidas, e da Lisboa aquando a viveu.
Ficam aqui alguns dos poemas cantados: Sérgio, Adriana, José Mário, Amália.
- Sérgio Godinho – O’Neill (alguns poemas com endereço)
- Adriana Calcanhotto – Formiga Bossa Nova
- Linha da Frente – Perfilados de Medo
- José Mário Branco – Perfilados de Medo
- Amália Rodrigues – Gaivota
15:56 m – 15 MB
Download – Tomem lá estas que também são do O’Neill
João Cardoso
O pequeno feto chora, o pequeno feto ri, o pequeno feto joga à bola, o pequeno feto vota sim!… Não?
……………………………………………..
Lurdes espreguiçou-se e inspirou o ar fresco da manhã. Lambida pelo sol, passou a mão pela nuca e de olhos fechados pôs-se a ouvir as conversas dos pássaros, os sinos a badalar com langor. O dia convidava ao aborto e Manuela, sacudindo o torpor, procurou uma clínica. “Então, Martinha, como vai ser hoje?”, perguntou a enfermeira, “Mal passado, mas não como da outra vez, que andei a encharcar os lençóis uma semana”. Era um espaço pequeno mas agradável, dotado de água canalizada e esfregona, onde as agulhas eram fervidas antes de qualquer intervenção. “Prontinha! Não trouxe ninguém? Sente-se aí um bocadinho a ver televisão”. Júlia recordou-se das tardes que passava com a avó, a ver a Heidi e os anúncios, do rubor que sentia quando a gata se enroscava entre as suas coxas e de quando acordavam as três em simultâneo, limpando a remela a pensar no jantar. Mas hoje, embalada pelas notícias, apetece-lhe mais vomitar.
……………………………………………..
E a próxima pergunta é:
“Concorda com a eutanásia a padres homossexuais com os dentes podres da droga e ligações evidentes ao islamismo?”
……………………………………………..
E o esperma? O que havemos de dizer do esperma?…
……………………………………………..
Música:
- – M. Mussorgsky/Filipe Pinto-Ribeiro, piano (RU/PT) – Bailado dos passarinhos dentro das suas cascas;
- Américo Rodrigues (PT) – Não (exc.);
- Alvaro Peña Rojas (CHI) – Drinkin’ my own sperm;
- Coleen (FR) – Under the roof (exc.)
- The Band of Holy Joy (UK) – Don´t stick knives in babbies’ heads;
- Embrião abandonado ( ? );
- Horrific Child (FR) – L’Etrange Mr. Whinster (exc.);
- Lars Hollmer (SWE) – Boeves psalm;
- Monty Python (UK) – Every sperm is sacred (exc.);
- Xutos & Pontapés (PT) – Sémen
Vox:
– Maria Martin
– Pedro Lemos
Foto: Gárgula, Bois, 2004
18:00 m – 16 MB
Download – O pequeno feto
O pequeno facto aconteceu e ficou satisfeito, pois para si foi um grande feito…
–
O grande feito sorriu para toda a gente, agradeceu os aplausos e considerou-se indigno de tanta atenção. E tinha razão.
–
A razão evoluiu cautelosamente, guinou conscienciosamente e explanou-se meticulosamente ao comprido.
–
Música:
- Ennio Morricone – Rapimento In Campo Aperto
- Corroboree (Traditional Aboriginal Songs) – Otayba (exc.)
- Susanne Brokesch – Heroes (History mix)
- Animal Collective – We Tiger
- The Beach Boys – Sloop John B
- The Ventures – Theme from “A Summer Place” (exc.)
- They Might Be Giants – Kiss Me, Son of God
- Jon Rose – Extra Table 16 (exc.)
- Wordsong – Homem das Cidades (de “O Guardador de Rebanhos”, Alberto Caeiro)
Textos, Vox: Pedro Lemos
Foto:18:30 m 17 MB
Download –O pequeno facto
Para meninos que fazem anos.
Para o João José Fernandes Reis
1
Era uma traça muito traça, daquelas traças de pura raça, da que traça sempre a direito, sem olhar para trás.
Era uma traça dessas, das que sabe bem como se desenlaça qualquer malha, por mais fiada ou apertada que seja.
2
E foi uma dessas traças, das de pura raça, que traçou o casaco preto desta estória, que era uma estória bem vestida, com todos os pontos e linhas bem certinhos até ao dia em que a traça apareceu. Mas é melhor começar pelo princípio e contar como tudo aconteceu.
3
O Verão começara já há alguns dias e o calor sentia-se claramente em tudo. As estórias de Inverno deixaram de servir e era tempo de arrumá-las bem arrumadinhas no armário para que não se estragassem com o sol.
4
E assim foi o que aconteceu com esta estória, uma estória que passou de boca em boca naqueles meses em que chovia ou estava demasiado frio para sair de casa.
5
Os pais e os avós contaram-na, os filhos e os netos ouviram-na, e todos a sabiam de cor, pois as palavras, as vírgulas, os uis e os ais e outros que tais estavam sempre no sítio, prontinhos a aparecer no momento certo.
6
Esta estória era a estória do casaco preto de lã de ovelha, muito fofa e muito quentinha. O casaco preto, acreditem ou não, antes de ser casaco também foi fio de lã enrolado num novelo. E esse fio de lã preto, também em tempos foi branco e todo encaracolado.
7
Pois é verdade. Antes de tudo isto foi pele de ovelha, ou seja, casaco de ovelha.
As voltas que isto dá! Quem diria que de casaco branco de ovelha todo encaracoladinho se passa a fio de lã preto enrolado num novelo e de novelo a casaco preto de lã, sabe-se lá de quem…
8
E de lá para cá, de cá para lá, o casaco preto de lã andou, passou de mão em mão: de quem o fez foi para quem o quis, quem o quis o vestiu e despiu, e quando não quis o guardou.
9
Foi assim que, no dia em que o calor apertou, o casaco no armário ficou. Bem pendurado para não ficar deformado, bem guardado, para não ficar estragado.
Mas por vezes o destino é trapaceiro e daquela vez a trapaça foi mesmo uma traça cheia de traça que traçou a desgraça.
10
Aproximou-se devagar, como quem não quer a peça, e logo se tomou de amores pelo casaco preto de lã. E, traça que traça, a traça de boa raça logo se abraça à boa lã, picando aqui e acolá.
Satisfeita, a traça voou e o casaco lá ficou, agora com pouca lã, mais parecendo um farrapo velho.
11
O Inverno seguinte chegou e era tempo de abrir o armário, tirar o casaco de Inverno e arrumar o de Verão. Quer dizer, era tempo de contar as estórias de Inverno e guardar as de Verão. Mas como? O casaco estava tão esburacado que até metia dó! Para que servia? Só se fosse para fazer uma rede para apanhar peixes… E foi isso mesmo que aconteceu.
12
Aproveitou-se o que se podia, teceu-se uma rede e agora o casaco preto de lã é uma estória de Verão. E sabem porquê?
Porque anda no mar, feito rede, nas mãos de um menino a apanhar peixes a brincar.
Músicas:
- Syd Barret – Baby Lemonad
- Syd Barret / Pink Floyd – The Gnome
- Uakti – Earth
- Adriana Calcanhotto – Saiba
- Michel Giacometti (recolha) – Ró Ró (Trás-os-Montes)
- Galandum Galundaina – Chin Glin Din
- José Afonso – Barracas Ocupação
Texto: Isabel Rosas
Desenho: Emília Gouveia
Realização: João Cardoso
12:29 m – 12 MB
Download – A Traça
O rumble fish, um betta splendens, claro, pinou, foi-se, finou-se, baicou, faleceu, morreu, não esticou o pernil mas a barbatana, bateu a caçoleta, esta noite.
Sem combates, acordou como uma mancha azul no fundo do aquário.
Esta é a banda sonora para o velório e enterro, num vaso plantado, que na natureza nada se perde. Eu perdi o meu peixe de estimação, e fiquei sem palavras, sem voz, e por acaso estou farto de não ter micro.
Deixa, o peixe, uma jovem viúva, não sei por quanto tempo.
Música:
- Talking Heads – Heaven
- Hedningarna – Kaksi
- Jimi Hendrix – Purple Haze
- Frank Zappa – Purple Haze
- Sid Vicious / Sex Pistols – My Way
João Cardoso
14:10 m – 13 MB
Download – Rumble Fish
… A pigmentação da ervilha? A ablação da cedilha? O regresso da patilha? Não atinar com a presilha? Os eflúvios da virilha? Entalá-lo na braguilha? A vulgarização da guerilha? O orangotangas da ilha? Conversa de pacotilha? Irem-te ao pacote à filha? Ter que separar a pilha? Seguir a boa cartilha? Alombar com a bandarilha? O calibre da tua anilha? Alinhar com a pandilha? Regurgitar a pastilha? O teu quinhão na partilha? O tresmalho da matilha? Ter que dar à sapatilha? Cair numa armadilha? A oclusão da escotilha?… O travo da salsaparrilha?…O que é que te calha?…… A cintilação da pantalha? A apologia da palha? A apoteose da tralha? A exultação da maralha? A inocência da gralha? A exaltação da canalha? A política da migalha? Uma camisolinha de malha? Meter lenha na fornalha? Fazer dos ossos metralha? Dar uso devido à limalha? Esfregá-la no pito à pirralha? Submeter-lhe a carne à navalha? Aproveitar para tingir a toalha? Invocar os da tua igualha? Aconchegar-lhes a mortalha? A renovação da escumalha? Que se construa a muralha?… Manter sistémica a falha?
Música:
- VVV (Vega/Vainio/Väisänen) – 11:52 PM
- Max Eastley – Two 150 Kilo Blocks of Melting Ice With Layers of Stones Embedde Falling Onto A Metal Plate for Climate Change Project Cape Farewell
- Electrelane – Gabriel
- Mão Morta – Atentado no Metropolitano
- Negativland – Car Bomb
- R. Stevie Moore – Holocaust Parade
- Eugene Chadbourne – The Girl From Al-Qaeda
- Martin Archer – It Don’t Bother Me
- Tom Zé – Curiosidade/ “W.C. Bush” (Sines 2004)
- José Mário Branco – Se do Império
Voz 1, realização, textos, foto: Pedro Lemos
Voz 2: Maria “Cold” Martin
Foto – Dubrovnik 2004
25:27 – 24MB
Download – O que é que tequilla?…
Quando afrontas alguém que “amas”, estás a testar a tua própria ideia de amor, à procura da essência, dos contornos, dos limites. É isso que te importa, não o amor, embora essa tua ideia possa ser tão fluída ou imprecisa quanto o próprio. O amor não se constrói, o que pensas dele sim. Quiçá o contrário: o que pensas do amor não é construção tua, o amor que entretidamente alimentas talvez. A não ser que sejam o mesmo, a ideia e o amor, e este esteja todo e só na tua cabeça (embora mais depressa no teu corpo). E não resulte de factores exógenos tão redundantes como a existência do objecto amado. E dos sinais que emite. Ou da conjugação, in, con, semi consciente, do que a tua cabeça engendrou a propósito da pessoa do outro e do que o outro aparentemente te revela, com a tua ideia de amor, ou com a ideia que tens agora do amor. O que recomenda um sério esforço de simplificação:
«amor amor amor p’ró grelo
amor amor amor p’rá pissa»
Agora já podemos começar a falar da coisa…
… O amor é uma grande foda que se desgasta, desgosta, recalcitra e fode-nos bem. O amor contra o outro, entenda-se, o amor que inflama e arrasa o amor próprio, quando não propriamente o próprio E não o amor místico, que é uma maluqueira como outras, no limite uma obstinação malsã, de que são exemplos o amor parental, o amor à pátria, o amor divino, tudo males que se anunciam por bem – com prognóstico reservado, é certo -, e não bens que vêm por mal, como o verdadeiro amor. O amor-arrebatamento, o que alucina, assombra e captura, causando dormência, dependência, comichão, e o seu alegre espelho convexo, o amor-redenção. Também conhecido por amor-receita, remédio para a iniquidade e o desespero, arquétipo do sentimento de culpa dos sistemas sociais. Princípio activo: tolerância. Amor arrebatador, tolerante e redentor. Amor-comprimido, tolerado, enrabado. Auto-indulgente, onanístico, castrador. Amor que funciona muito bem. Amor que, sendo um conceito político, não existe. Amor que, sendo uma grande foda que se desgasta, deixa-se foder e fode-nos bem…
… Quantas voltas tenho que te dar para que fiques conforme, rabiscava eu, torcendo a ideia de amor até a enxugar por completo, quantas voltas mais aguentas? Mas não podia continuar a escrever, faltava-me convicção. E antes um exercício falhado do que perder a matéria para sempre…
Música:
- Serrote
- Johann Sebastian Bach – courante da suite V para violoncelo/Paolo Besci (exc.)
- Jackie – O Motherfucker – Sun ray harvester (exc.)
- Valdo (recluso) – Fome de amor, dito por Mário Viegas
- Eric Peters – Electronic rhythm (exc.)
- The Cramps – Can your pussy do the dog
- Monty Python – Sit on my face
- People Like Us – ILY
- Domenico Scarlatti – Inflammatus et accentus, do Stabat Mater/Ensemble Vocal e Instrumental de Lausanne, dirigido por Michel Corboz (exc.)
- Chuck E. Weiss – Do you know what I Idi Amin (exc.)
- Canto de glória iakoute, Rússia (exc.)
- Eszter Balint (Serge Gainsbourg) – Un poison violent, c’est ça l’amour
- Mler Ife Dada – L’amour va toujours bien, merci.
Citação: Benjamin Péret, Os Tomates Enlatados
Textos, voz, foto, – Pedro Lemos
Outra Voz, – Maria Martin
26:27 m 25 MB
Download –Amor, amor, amor…
começou por libertar um dos ofegantes seios da prepotência do vestido, e quando o mostrava dizia: vou-lhe dar um presente
as coisas concisas são coisas concretas trazia muito rouge nos lábios
falava no coiso, o remoinho leva-te para o fundo do rio mas nadar tão depressa fica ao menino como
tentação
ai deixar ai deixar, ser lambido tão de mansinho…
Som:
- 3 tristes tigres – visita de estudo
- marlene deitrich – falling in love again
- ao bordel – mon homme
- franka zappa – willie the pimp
- einstruzende neubaten – silency in sexy
19:36 9:19
Download – Aquilo que cai ao chão é nosso
João Cardoso
Cobiçar a mulher do próximo é pecado.
Cobiçar a mulher do alheio é pecado.
Não se cobice a mulher. Mesmo que ferva
Não se procure a mulher do próximo mesmo que alheio
Não serve uma mulher a dois homens
Pode servir-se ela de dois ou mais até
Mas como pode servir a dois homens
Quando entre eles se atravessa o ciúme?
Queremos a propriedade do outro
Mesmo quando nem amamos
Quando já nem queremos
É da irracionalidade que se faz o ciúme
A matéria mesma dos sentimentos
Que acusas aos outros: não tens
Som:
- The Big Gundown: John Zorn Plays the Music of Ennio Morricone
- Poverty (Once Upon a Time in America)
- Once Upon a Time in the West
- Adriana Calcanhotto – Fico Assim Sem Você
- Leonard Cohen – Famous Blue Raincoat
- Caetano Veloso – Sonhos
- Cole Porter – Miss Otis Regrets:
- Bette Midler
- Nat King Cole
- Bryan Ferry
- Nancy Wilson & Cole Porter
- Ella Fitzgerald
- Kirsty MacColl & The Pogues
16:48 16 MB
Download – Cobiçar a mulher do próximo é pecado
João Cardoso
(Pum ema)Detém-te, olhando à tua volta estrabicamente e repara no que dentro de ti se agita.
São pruridos caí tens, a digestão do teu dia ou uma líbido indó mita?
É a useira impressão? Não cedas!, ultrapassa-a com a firmeza
Que vai comendador dos crentes, ateus e agnósticos
E dos que se cagam para isso
Depois fodes-te
Na mesma
O atum
Não, nessa altura ainda não era um atum. Evitava frequentar cardumes para não ser apanhado na pesca de arrasto e se tal acontecia mostrava-se bastante indignado e voltava a mergulhar. É certo que já não recebia os amigos como dantes e os últimos encontros só ocorriam em alto mar, e que se o tentavam convencer a voltar não fazia mais do que adejar impaciente as escamas. Ou responder, com um cúmplice piscar de olho, “uma ova!”.
Houve dor e alívio quando deixou de dar à costa. Dor da parte do lumbago e alívio da parte intestinal.
HaikuCaraças…Já perdi
A conta
Às gajas que não comi
Música:
- Erik Satie – Três Gnossienes 1 (Hakon Austbo, Aldo Ciccolini, Grim);
- Philip Glass – Satyagraha: King – 1.ª parte (exc.);
- Os Poetas/Mário Cesariny – Em Louvor e Simplificação de Àlvaro de Campos;
- M. Giacometti/F. Lopes Graça (recolha) – Cantilena da pedra (Serraquinhos, Montalegre);
- Blind Willie Johnson – Dark Was the Night Cold Was the Ground;
- John Fahey – On the Banks of the Owchita;
- Neu! – Im Glünde (exc.);
- Dona Zica – O Fio da Comunicação;
- Interjeições do Teatro Nô (Japão);
- Sisa – Comiendo Pollo (Catalunya).
18:49 17 MB
Download – Para fusos e para lusos distintos
Pedro Lemos
O que é o que é uma pequena vontade mais que a ausência de qualquer vontade?
Acabaram-se. As oportunidades. Numa altura, as oportunidades não se acabam, recomeçam. Mas recomeçam como se outra coisa. A outra coisa não depende mais do que da vontade.
Ah, pois, a vontade.
O que é uma pequena vontade mais que a vontade que não é grande?
Sinto-me pouco. À vontade. Quantas vezes tive tão pouca como a que não tive quando…
Quando o podia ter feito, o que não fiz. Quando não fiz o que fiz. Sem vontade.
A vontade é a parte seguinte. Têm-se, não, nem por isso
A vontade é a última oportunidade de quem não teve vontade.
Tu, vais ter vontade.
Som:
- The Velvet Underground
- Leoni
- Pedro Abrunhosa
- In Taberna
- The Sex Pistols
- Jonathan Richman and The Modern Lovers
- Lou Reed
- Frank Zappa
- Aboio (recolha M. Giacometti)
Download – O que é o que é uma pequena vontade?
João Cardoso
Ficar a apodrecer.
As coisas ficam a apodrecer, nós não.
Ficamos da cor do podre, ao acordar, ninguém tem nada a ver com isso.
- Michel Giacomett [recolha]- Tralhoada – Alentejo
- Uígures
- Caetano Veloso – É Proibido Proibir [versão mono original em single]
- In Taberna
- John Zorn – The Big Gundown: John Zorn Plays the Music of Ennio Morricone – La Classe Operaia Va in Paradiso
- Anuna – The First Day
- José Mario Branco – A Mãe, As Canseiras Desta Vida
- Xutos & Pontapés – Fim do Mês
- José Afonso – Viva o Poder Popular
João Cardoso
Intrujar, enrolar, aldrabar, trapacear, comer por parvo, burlar, explorar, embustear, mentir, lograr, defraudar, iludir, falsear, tanguear, engrupir e baralhar, endrominar. Nada disso nos passa pela cabeça, não estamos aqui para vos enganar… Se não têm graveto, não precisam de pagar, mas é levar agora que amanhã é a dobrar.
A vez
– É a minha vez?
– É a tua voz.
– Está tão baixinha…
– É um sussurro.
– Quase não se ouve…
– Deve querer dormir.
– E achas que consegue, com tanta gente a ouvir?
– Não sei. Experimenta deixá-la.
– Aqui?
A tíbia
Era uma vez uma fractura na tíbia que andava aos tordos. Eis senão quando um forte nevão. Os dias passaram, pesados e longos, em tons de verde-azeitona, sem palavras. Casaram, tiveram muitos filhos e foram felizes para sempre.
A sopa
Acordei prematuramente a fazer sopa com uma corda ao pescoço. Sem ingredientes, a sopa não fervia, e eu gemia como uma flanela ao frio. Acudindo, a lua voltou da noite e de repente a flanela estava morta, morna e a panela igualmente. Como não tinha moedas, enfiei duas pedras de rim na boca e esgotado, assobiei uma marcha militar.
Música:
- Pastilha de nicotina;
- João de Sousa Carvalho/Orquestra Barroca Arte Real Ensemble – Miserere Nostri Domine;
- Biota – Wire Talker (exc.)
- António da Nóbrega – Vinde…
- Original Steirische Bauernkapelle – Länder 2 (exc.);
- David Thomas and Two Pale Boys – Planet of Fools;
- Domenico Scarlatti/Teodoro Anzellotti – K 283 Andante Allegro (G Maior) (exc.)
- Skeleton Crew (Fred Frith/Tom Cora) – The Washington Post
- Holger Czukay – Der Osten Ist Rot (exc.)
- Grim – Gnossiénne 1.
Textos: Pedro Lemos, Voz – Pedro Lemos, Maria Martin
O que é uma pequena cabeça a pensar mais do que uma cabeça pequena que não pensa? Coisa grande. Não é uma missão, nem apenas mais um trabalho. Depois destas reformaste-te, não fazes mais nada, e vais à procura do coisa alguma para onde quiseres. Pensa. A desistir desiste já, tens ainda uma noite para ouvires o beijo no carro. Depois sei que desistes. E ficamos a tratar dos pormenores, não vale a pena falarmos agora do que vais desfazer depois, aguenta esta noite, ficas com umas férias. Rebenta, a ideia é essa, rebentares, teoria da motivação do trabalho, capítulo I, os gajos rebentados produzem mais sobretudo se ouvirem as gargalhadas, as gajas então rentabilizam que é um disparate, é pá é assim, temos a vida inteira pela frente, mesmo que já não reste grande coisa. Estamos conversados. Ainda tens uma noite pela tua frente? Não é a ultima noite, nem pensar nisso é bom, ainda nem ouve o beijo, e isto para ti é caca, passas-te na vida a gabar-te. Como os cestos. Só precisas de não te esquecer de nada. Leva as roupas, também não tens muitas, os apetrechos. Leva tudo de casa. Depois decide que não vais ter outra. Casa. Tempo. É um velho filme, um velho personagem. Deixa de fugir à estória. Tinhas 12, 21, 42 anos. 70, 80 1999. Agora tudo fluía e soltava-se ao correr da pena o fim não se faz por este meio. Ter alucinaudições. Estar perdalunidado. O que é o grande mais do que uma coisa apenas maior do que a cousa pequena? Aí está. Foi o princípio de uma breve claridade. A treva vinha, e ia. As televisões quanto tempo duram ligadas? Os fogões começam ganhar ferrugem pelos bicos, ou pelas costas? Gostas de ouvir? Já comeste a música?
Música:
- The Velvet Underground
- Geraldo Vandré
- Eduardo Ramos
- The Doors
- Fausto
- Jonathan Richman and The Modern Lovers
Texto, voz e foto: João Cardoso
20m : 54 s 19 MB
Download – O que é uma pequena cabeça a pensar